
Maio Furta Cor: Mês de Conscientização sobre a Saúde Mental Materna
- Clinica Villas Psi
- 31 de mai.
- 4 min de leitura

Saúde Mental Materna: quando cuidar do bebê começa por cuidar da mãe
A maternidade é um período de profundas transformações biopsicossociais. Entre o ideal cultural da “mãe plena” e a realidade vivida pelas mulheres, há um campo marcado por intensas ambivalências. Enquanto se celebra o nascimento de uma nova vida, muitas vezes silencia-se o que nasce dentro da própria mulher: dúvidas, exaustão, angústia e até sofrimento psíquico. É nesse contexto que a psicologia perinatal emerge como uma área essencial para o cuidado da saúde mental materna.
O que é psicologia perinatal?
A psicologia perinatal é o campo da psicologia que estuda e atua sobre os aspectos emocionais e subjetivos que envolvem o ciclo gravídico-puerperal — ou seja, desde o planejamento da gestação até o pós-parto e os primeiros anos do bebê. Trata-se de um momento crítico do desenvolvimento emocional da mulher, do bebê e da família como um todo, exigindo atenção integral e contínua.
Pesquisas apontam que esse período pode desencadear ou agravar quadros de sofrimento psicológico, como ansiedade, depressão, transtornos obsessivo-compulsivos, transtornos do sono e até episódios psicóticos, como a psicose puerperal (Field, 2017). Por isso, o acompanhamento psicológico não é um luxo, mas uma necessidade de saúde pública.
Dados preocupantes sobre a saúde mental materna no Brasil
Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), cerca de 1 em cada 4 mulheres brasileiras apresenta sintomas de depressão pós-parto, um dos transtornos mais comuns no período perinatal. Essa condição afeta não só o bem-estar da mãe, mas também o vínculo com o bebê, o desenvolvimento infantil e a dinâmica familiar como um todo (Fiocruz, 2016).
Além disso, o estudo “Nascer no Brasil”, também da Fiocruz, revelou que muitas mulheres enfrentam o puerpério em isolamento social, com pouca ou nenhuma rede de apoio, agravando os riscos psíquicos (Leal et al., 2016). É nesse cenário que termos como carga mental materna, solidão materna e idealização da maternidade tornam-se centrais para compreender o adoecimento silencioso de tantas mulheres.
A idealização da maternidade: um fator de risco psíquico
A construção cultural da “mãe perfeita” — sempre disponível, amorosa, satisfeita e grata — é um fator adoecedor quando confrontada com a realidade concreta da maternidade. A psicóloga perinatal espanhola Ibone Olza (2019) explica que a maternidade real é atravessada por ambivalência: é possível amar e se irritar, cuidar e se sentir exausta, desejar estar perto e precisar de espaço.
Essa idealização dificulta o pedido de ajuda e alimenta o sentimento de culpa nas mulheres que vivenciam dificuldades emocionais. Por isso, é fundamental romper com esses padrões irreais e abrir espaços de escuta sensível e não julgadora.
Rede de apoio: um fator de proteção para a saúde mental
A presença de uma rede de apoio emocional e prática é um dos fatores mais protetivos para a saúde mental materna. Segundo Guedes et al. (2020), mulheres com apoio social adequado têm 70% menos chance de desenvolver depressão pós-parto. Essa rede pode incluir o(a) parceiro(a), familiares, amigas, profissionais de saúde e psicólogos.
Gestos simples — como preparar uma refeição, segurar o bebê enquanto a mãe descansa ou simplesmente perguntar “como você está, de verdade?” — têm valor inestimável. Eles sinalizam à mulher que ela não está sozinha e que merece cuidado também.
Cuidar de si para cuidar do outro:
A psicóloga britânica D. W. Winnicott (1975) já falava da importância de uma “mãe suficientemente boa” — aquela que não precisa ser perfeita, mas sim real, humana e disponível dentro dos seus limites. Essa mãe, ao reconhecer suas necessidades, pode buscar suporte e se fortalecer emocionalmente para exercer a maternidade com mais leveza e autenticidade.
É hora de parar de cobrar perfeição das mães e começar a oferecer acolhimento. A escuta psicológica durante a gestação e o pós-parto pode prevenir transtornos graves, fortalecer o vínculo materno-infantil e promover uma maternidade mais consciente e possível.
Falar sobre saúde mental materna é romper o silêncio que adoece e abrir caminhos para o cuidado verdadeiro. Mães não precisam dar conta de tudo, nem se anularem para provar que amam seus filhos. O amor materno também passa pelo cuidado com a própria mulher que existe antes da mãe.
Neste Maio Furta-Cor — campanha nacional de conscientização sobre a saúde mental materna — o convite é claro:
Vamos cuidar de quem cuida. Porque nenhuma mãe deveria maternar sozinha.
Referências
FIOCRUZ. Pesquisa Nascer no Brasil: Sumário Executivo. Fundação Oswaldo Cruz, 2016.
FIELD, T. Postpartum depression effects on early interactions, parenting, and safety practices: A review. Infant Behavior and Development, v. 50, p. 1–6, 2017.
GUEDES, R. N. et al. Suporte social e sintomas depressivos em puérperas. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 73, supl. 4, 2020.
OLZA, I. et al. Maternidade e saúde mental: da idealização ao cuidado. Revista da SPAGESP, v. 20, n. 3, p. 52-61, 2019.
WINNICOTT, D. W. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.
LEAL, M. C. et al. Nascer no Brasil: pesquisa nacional sobre parto e nascimento. Cadernos de Saúde Pública, v. 32, 2016.
Ana Paula A. Paim
Psicóloga e Neuropsicóloga Clínica
Especialista em Avaliação Psicológica
Diretora e Responsável Técnica da Clínica Villas Psi
@clinicavillaspsi
@anapaim.neuropsi
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